Entretextos

                                                                       (Mara Paulina  Wolff de Arruda)




 

Silêncio[1]

Uma mulher fala a sós

Palavras desconexas

Sentada, fumando,

No degrau da porta de uma loja,

Uma mulher e dois homens,

 

Há vinte e cinco anos atrás o nobre historiador Eric Hobsbawm(1917-2012) foi entrevistado pelo jornalista italiano Antonio Polido. Na entrevista eles conversaram e refletiram sobre as mudanças no século XXI. Essa entrevista que tempos depois foi transformada no livro ‘O Século XXI: reflexões sobre o futuro[2]” trata de uma análise histórica de questões fundamentais da humanidade e seus tropeços nos anos idos  2000.  Refletiu sobre meio ambiente, mercado global, imigrações, nacionalidades, questões políticas, guerra e paz.

Um deles deitado no sofá,

O ruido do escapamento da

Moto, motores, motores em movimento

Um velocípede de brinquedo

Ao lado do sofá

A mulher olha

 

Diante das mudanças da paisagem política, social e cultural  Hobsbawn diz que é motivo de felicidade pela primeira vez na História, a maioria da população ser alfabetizada mesmo sabendo que há muito por fazer.

No processo de emancipação das mulheres, um traço do século XXI,  não podemos dizer que a política se tenha tornado diferente ou mais feminina. No entanto o progresso das mulheres é real.

 

O fogão a lenha improvisado

Perto da calçada

Esquentando as panelas

Mãos no rosto

Para limpar o suor

Não há onde se recostar

O som ensurdecedor do atrito dos freios de amianto

A betoneira avança

Caladas na mesma calçada que divide as pistas sob o viaduto

 

Eric Hobsbawn não fala da América Latina nesta entrevista, mas ele esteve no Brasil em alguns eventos e em Santa Catarina, na UFSC, 1992. Visionário da cultura previu o mundo global inundado de imagens, sons e palavras. Testemunhou o triunfo da sociedade da informação que o filósofo Byung -Chul Han vai chamar de Sociedade do Cansaço[3].

 

Uma carroça se aproxima, vazia,

Um cachorro sentado segue

Com olhar os carros

Rali insano

Um homem junto à guia

Limpa os restos

De comida do prato

O cachorro morde

O próprio rabo

Sirene de uma ambulância

Alguém se lembra do diabo

Um rosto grafitado

Na parede da boca do túnel

O rosto em close do grito de Munch

 

A História é cíclica. Diante dos acontecimentos o mundo vai sendo lido, pensado, modificado, independente dos fascistas, dos que que desejam o mal. Mesmo angustiado com o futuro os Historiadores, Filósofos e Poetas registram e torcem pelas mudanças da /na História de cada lugar que jamais deixarão de acontecer, de modo inesperado e melhor.


Mãos na cabeça

No entanto não há espirais

De pôr-do-sol entre nuvens

Azul-turquesa súbito

Mas apenas o túnel

escuro

 



[1] Régis Bonvicino, 1955-2025. Poeta paulista

Livro: Página Órfã. Martins Fontes, SP:2007

[2] Editorial Presença, Lisboa:2000

[3] Editora Vozes, Rio de Janeiro:2012

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