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  Olhos de peixe (Mara Paulina Wolff de Arruda)     Ilha onde tudo se esclarece Apesar dos encantos a ilha é deserta E as pegadas miúdas vistas ao longo das praias Se voltam sem exceção para o mar. (Wislawa Szymborska)     Vivo na beira do mar. Junto aos pescadores. Meu pai, um deles. Do nada foi embora. Nem deu adeus. Simplesmente fechou um olho e com o outro, estralado,   tombou ao lado da mesa. Tentamos fechar aquele olho, mas não teve jeito.   N o mar dos mortos está. Ele conhecia cada palmo dessa imensidão de água salgada que rodea a nossa ilha, sabia o que quer dizer a altura das ondas e as sinuosidades do vento sul, conhecia o percurso das tainhas e a música cantada pelas minhas parentes, as sereias.   Foi um   trabalhador do mar. Desconfiado. Casmurro.     Um tal Daniel, esquisito, de vez enquanto vinha aqui sussurrar nos ouvidos de Vanice Vanice, minha mãe. Dizem que sou desbocada. Debocha...
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  Entretextos                                                                        (Mara Paulina  Wolff de Arruda)   Silêncio [1] Uma mulher fala a sós Palavras desconexas Sentada, fumando, No degrau da porta de uma loja, Uma mulher e dois homens,   Há vinte e cinco anos atrás o nobre historiador Eric Hobsbawm(1917-2012) foi entrevistado pelo jornalista italiano Antonio Polido. Na entrevista eles conversaram e refletiram sobre as mudanças no século XXI. Essa entrevista que tempos depois foi transformada no livro ‘O Século XXI: reflexões sobre o futuro [2] ” trata de uma análise histórica de questões fundamentais da humanidade e seus tropeços nos anos idos   2000.   Refletiu sobre meio ambiente, mercado global, imigrações, nacionalidades, questões políticas, guerr...
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  E, por falar em Vinícius, onde anda você poesia?                                                                                                                    (Mara Paulina Wolff de Arruda)   Vinícius de Moraes, poeta, cronista e músico foi um dos maiores poetas brasileiros das décadas da fase áurea da bossa-nova.   Nascido no Rio de Janeiro em 1913, morto em 1980, deixou para a história da poesia ...
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  Cadeiras (Mara Paulina Wolff de Arruda)   Tenho cadeiras antigas.   Desde o dia que fiquei autônoma de mim mesma providenciei uma mesa redonda com cadeiras que tivessem a mesma linha circular. Minhas cadeiras são de metal e estofadas. Olhando bem para elas já chegaram ao ponto de trocar porque como tudo na vida, elas, também, envelheceram. É claro que ainda podem ser usadas mais um bom tempo. O material de sua estrutura é forte. As cadeiras mais antigas foram criadas pelos egípcios e eram de grande riqueza e esplendor. Feitas de ébano e marfim, esculpidas e cobertas com materiais caros. Objeto histórico, de arte e do cotidiano as cadeiras tem muitas utilidades. Podem ser usadas como metáfora aos sentimentos raivosos    “Te dou uma cadeirada” ou trocas políticas “A dança das cadeiras” Penso em Vincent Van Gogh que pintou cadeiras à espera de Paul Gauguin. O amarelo da palha no assento salta no quadro, a estrutura do objeto é de madeira. As cadeira...
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  Ele me ensinou tanto (Mara Paulina Wolff de Arruda)   O escritor David Lodge, 1935-2025, foi um professor de literatura e escritor britânico. Iniciou sua carreira de escritor   em 1960. Foi finalista duas vezes   de um dos mais importantes   prêmios, na década de 1980, o Booker Prize. Escreveu mais de vinte romances e obras de ficção. Artigos, críticas literárias e peças de teatro. Começou a ser traduzido no Brasil nos anos de 2000. No livro A Arte da ficção Lodge explica com fineza e argucia o complexo problema do fazer literário. Em cinquenta artigos curtos, demonstra a estrutura narrativa pensando   trechos tirados de obras-primas: Jane Austen, Joseph Conrad, James Joyce, Laurence Sterne entre outros fazem a ponte crítica com o leitor, com o aprendiz de literatura. Através das referências-pequenos trechos- de grandes clássicos ensina como funciona a criação de personagens e os ambientes onde transitam.   “Eu sempre entendi a ficção ...
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ESQUECIMENTO    Hart Crane, 1930 O esquecimento é como uma canção Que, livre de ritmo e cadência, flutua. O esquecimento é como um pássaro de asas unidas, estendidas e imóveis, - Um pássaro que adormece aos ventos da costa. O esquecimento é chuva durante a noite, Ou uma velha casa na floresta, - ou uma criança. O esquecimento é branco, - branco como as árvores sem vida, E pode atordoar a sibila em profecia, Ou enterrar os deuses. Hei de lembrar-me bem o que é o esquecimento. Tradução de Samantha de Sousa. In: Um café para minha gastrite. Disponível em:< http://umcafeparaminhagastrite.blogspot.com.br/2012/03/harold-hart-crane-traducoes_31.html>. Acesso em: 16. Abr. 2016. FORGETFULNESS Forgetfulness is like a song That, freed from beat and measure, wanders. Forgetfulness is like a bird whose wings are reconciled, Outspread and motionless, -- A bird that coasts the wind unwearyingly. Forgetfulness is rain at night, Or an old house in a forest, -- or a child. Forgetfulness i...
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  O Cinema e a História (Mara Paulina Arruda)       Num tempo em que tudo é imagem fugaz um filme brasileiro com uma história real arrebata os espectadores no Brasil e no exterior. Fui assistir “Ainda Estamos Aqui’ filme de Walter Salles e protagonizado por Fernanda Torres e Selton Mello. O filme é a adaptação cinematográfica do livro homônimo Ainda Estou Aqui de Marcelo Rubens Paiva.   Caminhava com passos lentos, um pouco tensa sabendo que o filme   é parte da história vivida por meus pais, nos anos ido de 1970. Não vivíamos no Rio de Janeiro. Vivíamos no interior de Santa Catarina. Lembro de meu pai chegando em casa e dizendo que  tudo estava escuro se referindo ao tempo ditatorial no Brasil. Lembro do jornal citado por minha avó numa conversa no meio de um lanche à tarde: Ela, com seus 70   anos,   atenta ao noticiário na televisão: O engenheiro e deputado cassado Rubens ...